Entenda a modalidade terapêutica que pode trazer a cura para a doença
Portadores de talassemia maior, por conta da baixa produção de hemoglobina no sangue, precisam realizar um tratamento rigoroso por toda a vida, com transfusões de sangue periódicas e medicamentos conhecidos por quelantes de ferro, para retirar o ferro em excesso (por conta das transfusões sanguíneas) do organismo, e não prejudicar órgãos como o coração, fígado e pâncreas.
Todo esse protocolo terapêutico tem início logo nos primeiros anos de vida e, ainda que essencial para que o paciente possa viver bem e com qualidade, é compreensível que possa ser cansativo em alguns momentos. E aí vem a pergunta: um dia será possível curar a talassemia?
Bem, na verdade, a cura já existe. Dentre as opções estão o transplante de medula óssea alogênico, quando um doador 100% HLA compatível doa as células-tronco da medula óssea saudáveis ao portador de talassemia, para substituir as células (hemoglobinas) doentes.
“Na década de 1980, foram realizados os primeiros transplantes alogênicos para curar a beta-talassemia. Neste tratamento, o paciente faz uso de medicações que extinguem suas células-tronco, células localizadas na medula óssea que fabricam as células do sangue. A seguir, células-tronco de um indivíduo saudável, que produz hemoglobina normal, são colocadas no paciente e, após algum tempo, estas células passam a comandar a fabricação do sangue. Este foi o primeiro tratamento bem-sucedido. No entanto, diversos fatores limitam o uso do transplante, entre eles a falta de doadores compatíveis e algumas complicações deste tratamento”, explica o Dr. Nelson Hamerschlak, responsável pelo setor de Transplante de Medula Óssea no Hospital Israelita Albert Einstein.
Mas, uma nova técnica também tem sido utilizada para a cura da talassemia maior: a terapia gênica, um tipo de tratamento genético que objetiva corrigir a doença por meio de modificações no código genético do paciente. Ela acontece assim:
- As células tronco da medula óssea do paciente são coletadas por meio de um procedimento chamado aférese, e enviadas ao laboratório para as modificações necessárias no código genético.
- Estas células modificadas são recolocadas no paciente, que assim como no transplante alogênico, faz uso de medicações para extinguir as células de sua medula óssea.
- Uma vez que as células modificadas passem a comandar a produção do sangue, os glóbulos vermelhos (hemoglobinas) produzidos serão saudáveis e o paciente, na maior parte dos casos, fica livre das transfusões de sangue.
“Há várias maneiras de modificar o código genético do paciente. Para a beta-talassemia, as principais são a inserção de um gene saudável de betaglobina no DNA do paciente e a edição gênica, em que uma ferramenta corta o DNA e induz seu reparo. Para esta última técnica, os alvos no código genético são principalmente as regiões que regulam a produção de hemoglobina fetal, um tipo de hemoglobina que normalmente não é produzida após o nascimento, mas cuja presença pode melhorar muito os sintomas da beta-talassemia”, comenta a Dra. Karina Tozatto Maio, médica pesquisadora de terapia gênica no Hospital Israelita Albert Einstein.
Ambas as técnicas descritas acima já foram testadas em pacientes ao redor do mundo, e os resultados até agora são bastante promissores. Entre os pacientes com talassemia maior, não há registros de mortes ou doenças graves relacionadas à terapia gênica. Além disso, a maior parte dos pacientes diminui muito a necessidade de transfusões ou fica independente delas, especialmente as crianças.
“No entanto, este tratamento é relativamente recente, tendo sido utilizado pela primeira vez para beta-talassemia em 2008. Portanto, é necessário continuar a estudar a evolução dos pacientes tratados para comprovarmos a segurança e a eficácia destas técnicas a longo prazo. Os custos da terapia gênica ainda são muito altos, o que a torna menos disponível. Porém, a tendência é que esta terapia seja cada vez mais acessível, porque traz grandes benefícios a estes pacientes”, finaliza a médica.
Fonte: Comunicação Abrasta, com o apoio de ambos os médicos entrevistados